quarta-feira, 16 de novembro de 2016

A sério? Outra vez arroz?


Em todas as ruas por que caminhas, metros que apanhes ou autocarro que espera durante a noite há sempre um abraço ou um carinho a ser dado. Há quem se sinta incomodado como eu. Há até aqueles dias em que parece que o amor te passa ao lado. Nesses dias não ignores, observa, recorda-te. Afinal não é desse arroz que tu tanto gostas?

Por vezes associo todo esta inquietude com um prato de arroz. Há quem goste dele frito, há que frita um bom arroz de manteiga. Há quem leve anos a evitar que cole ao tacho e há sempre quem consiga escolher à primeira o número certo de copos de água a utilizar. Contudo, seja qual a sua forma de cozinhar todos o que o fazem o comem afinal é essa a refeição quente que preparam para esta noite.

Passam os dias naquele cidade que te acolhe e quanto sonhas por uma prato de arroz saído da panela quando chegas das aulas. O frio da rua, por aqui, ainda não é muito, mas também as árvores já adotaram a coleção de outono/inverno.
Despem-se as árvores e tu vestes-te ainda mais. Vestes-te de saudade, de sorrisos quando te lembras dos momentos quentes de verão. Que bom que era mais um prato de arroz. Ora na praia, ora ao pôr do sol, ou até quando a madrugada na tenda te começa a incomodar.
Já não te vestes de lágrimas porque os dias parecem correr. Parece que os dias de verão voltaram ou até que retornamos aquela semana tão eterna que decidiu mostrar como o tempo sabe ser fugaz. Agora é que corres? Agora que me habituaste aos repetidos pratos de arroz é que me recordas que também eu tenho a minha refeição quente?

Continuas a caminhar e já te sentes-te. Puro inferno que os teus olhos vêem. Outra vez os mesmo? Outra vez os dedos entrelaçados e o encosto de um beijo? Sabes quantas vezes te pedi que fosse eu? Pois bem, agora que me contestas eu ainda quero mais! Quero o meu prato de arroz assim que chegar a casa ou até mesmo naquelas caixas portáteis que podemos carregar no metro!

Sabes tempo vou contar-te um segredo. Quando me ocupas a mente e o corpo eu não me esqueço de ti. Mesmo quando corres ou passas cada segundo como se um minuto se tratasse eu sei que continuas regular e pontual. Nunca falhas um dia, nem mesmo quando te peço mais uma hora para sonhar.
Afinal o meu prato preferido é arroz e mesmo que esteja embalado em distintos pacotes eu sei que o consigo encontrar.

Simbólico em exagero ou compreendido por quem o sente, esta é a minha refeição preferida. Desta vez só eu vim, mas numa próxima oportunidade vou trazê-lo a meu lado. Assim, talvez seja a mente de outros a perguntar: a sério? Outra vez arroz?




sábado, 5 de novembro de 2016

Persistência da memória

Na tua rua há sempre aqueles dois que passeiam de braço dado. Um beijinho na bochecha, outro na teste e nada mais do que os dedos entrelaçados uns nos outros.
Há sempre aquelas duas personagens que não encontram os limites da expressão do amor e se abraçam como que num espaço íntimo ou de toque pessoal.
Há sempre os dois corações que faz anos que se sentam no mesmo banco. Sempre à mesma hora, sempre com o sol no mesmo espaço do céu, mesmo que com o tempo aquele lugar comece a ser ocupado por mais pequenos corações.

No teu bairro há sempre quem passeio sozinho, no silêncio de um fio conectado à orelha que quebra a monotonia do vento e das folhas de outono que começam a dançar dos ramos das árvores.
No teu bairro há sempre quem se junte aos poucos. Um grupo de amigos que se cruza num olá animado de saudade, mesmo que ainda no dia anterior tenham testado o limite de paciência daquele que os tentar ensinar a relação entre os metais e os não metais da tabela periódica.

Na tua cidade há sempre quem caminhe de olhos postos no chão. Naquele equipamento iluminado que tantas vezes faz um sorriso embaraçado surgir na agitação da calçada.
Na tua cidade há quem caminhe no sentido inverso. Pareces ser tu, muitas vezes, mas com o tempo aprendes que a corrente a nenhum lugar te leva, pelo contrário, desencaminha-te.
Na tua cidade há quem esteja parado. Apático ou inquieto há sempre um movimento em si mesmo, nem que seja o coração a bombear a saudade nas suas veias. Há quem fique no mesmo lugar, mas cujo pensamento deambula por todo o micro segundo de pensamento.

Nestes locais nada te pertence ou tem o teu nome assinado por baixo. Mas, por estes instantes, procuras torná-los teus.
Não são histórias de imprensa cor de rosa, nem momentos de pura coscuvilhice. São histórias que se cruzam no teu caminho e que tu crias no regresso a casa. Afinal também te encontras em todos eles, nem que seja na persistência da memória.



quarta-feira, 2 de novembro de 2016

57 dias de mim

São mil histórias e momentos que estão por escrever e por guardar, mas até aqui era difícil registá-los numa plataforma que não o meu pensamento. São mil e um sorrisos acompanhados de mais mil e duas lágrimas.
Nada foi em vão, nem nada será. Nada fica esquecido, nem apagado porque tudo faz parte desta jornada.
Num programa de mobilidade encontramo-nos connosco mesmo. Aprendemos a lidar com a dor da saudade e com a força da mesma.
Manter a mente ocupada foi a grande lição que me ensinaram, não aqui, mas de alguém que sabe e sente o mesmo. Manter o tempo ocupado e a mente distraída. Não esquecemos quem veio também connosco, ou que partiu em busca de si mesmo, mas numa outra cidade.

Deixaram de ser 111 km para ser quase 1200.

"Mas isso não é nada, estás tão perto!" - diz o cérebro ao corpo
"E alguém te perguntou se era um número que importava?" - questiona o coração à mente
"Desliga e conecta-te à cidade" - responde-lhe a mente
"Então e se cada um se organizar em si mesmo e me deixasse inquieta como gosto de ser?" - pergunto eu mesma

Sabe quem parte em busca de si o quanto custa estar longe, mas também sabe quem o fez que a recompensa virá e o tamanho que pode vir a apresentar. Se a ti te custa, imagina aqueles que por ti esperam. As rotinas são as mesmas, o dia a dia não mudou, as pessoas que se cruzam têm o mesmo tom no olhar e na voz e tu aqui estás a ter o privilégio de te conhecer.
Está a funcionar? Estás a crescer? Talvez, quem sabe. Talvez, talvez, talvez... são as palavras que nestes dias encontras como resposta para todas as perguntas que te colocas e que te são colocadas.
Trabalhar cansa? Oh se cansa! Mas ajuda. Ajuda e concentra-te em ti e não no teu pensamento infinito de saudade.

Confuso o que escreves, tal como a tua mente se sente.
Confuso o que sentes, tal como o coração quando acelera por alguém.
Confuso o que queres, mas confia no teu corpo e deixa-te viver.

Sabe Deus, para aqueles que acreditam, o que sentes hoje que acordaste em busca de uma nova rotina.
Sabe tão bem voltares de casa e sentires-te amada e desejada. Por aqueles que tu amas e também por aqueles à qual a tua presença incomoda.
Sou viciada na companhia, na presença e odeio o silêncio. Porém, aqui, sentada no silêncio da madrugada, no céu onde trajetos de viagens se cruzam não procuro um avião ou uma fuga, procuro encontrar-me nesta cidade que outrora fará sempre parte de mim.
Para o bem e para o que seja menos bem, procuro reencontrar-me no conforto de uma cama emprestada, num quarto que sem janela para o exterior metaforiza o encontro virado para mim, para aqueles que me dão força para continuar.
Ora pois bem, são apenas uns kms a mais que o usual, mas sabe quem já saiu que o número não conta. A contagem, essa deixo-a de lado, para que a cada dia que passa, seja menos um dia que falta. Talvez um dia deseje ter tudo de novo, mas desta vez de braço dado.